segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O Último Beijo

Contava os minutos no relógio. O  momento de partir se aproximava. Não conseguia conter a ansiedade, olhando para todos os lados. Lá estavam pai, mãe e a querida prima, mas faltava ELE. Em poucos minutos, as chamadas ao portão de embarque começariam. Já perdendo as esperanças, ela dá uma última olhada cuidadosa na multidão.
Ao vê-lo, finca os pés no chão. Paralisa. Olham-se, enquanto  ele se aproxima, com o jeito displicente de um adolescente e seu habitual sorriso no rosto. Ela, que sempre implicou com isso, agora tem a certeza de que esse era seu maior charme.  Sim, era mesmo.
Vendo que um misto de contentamento e reprovação sombreavam o olhar da mulher, o atrasado apressa-se em perguntar:
-Achou que eu não viria mais?
-Ah, como se eu não te conhecesse... sei que você adora chegar em cima da hora.
 - Você sabe que eu jamais deixaria você ir embora sem me despedir.
Ambos sorriem um para o outro, como da primeira vez.
O  charmoso displicente trazia nas mãos um buquê das flores que ela mais gostava, o que sem dúvida o ajudaria  a se redimir. As rosas, que antes eram vermelhas, transformaram-se  em cor-de-rosa, e os copos de leite estavam tão bonitos e grandes como nunca estiveram . Serviria para enfeitar a mesa da sala do seu novo lar, pelo menos durante a primeira semana, se resistissem às longas horas de avião, é claro.
Lá estavam vindo as crianças, -  os gêmeos de 14 anos(um menino e uma menina) e a caçula de 5, que se lambuzava com um sorvete. Foram em direção ao pai, para  um afetuoso abraço.
As chamadas para o embarque começaram. Tanta coisa para dizer em tão pouco tempo... e somente a certeza de que  não seria possível dizer tudo.  Nesse instante, lembranças vêm, embaralhadas, à mente. Momentos de felicidade, tristeza, aconchego e solidão a dois... tudo que a vida lhes deu e lhes tirou tão de repente. Queriam dizer algo, mas a voz não saia. As palavras estavam presas... presas a um tempo que não volta mais.
Então, a voz que eles não queriam ouvir surge, ao fundo: “Passageiros do vôo 132, última chamada...”. Ele Resolveu acreditar no ditado que diz que um gesto vale mais do que mil palavras. Beija suas mãos, como quem pede perdão.  Ela derrama suas lágrimas, como quem  não entende como e porque chegaram  ali. Dois corações feridos, que a despeito de todo o sofrimento, ainda batem forte... e perdoam, pois sabem que o amor e o tempo curam qualquer ferida.
E nessa ânsia de dizer o que não foi dito, de transformar o silêncio em memória, os seus lábios se encontraram quase que num movimento involuntário. Pela força do hábito. Foi um último beijo. Ponto final. Última escala. Hora de virar a página e começar a escrever uma nova história; partir para um outro destino. O avião já não pode mais esperar. Nem eles.

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